Dave Grohl desliza seu corpo magro em seu novo ‘Vette e acelera. Ele dá um grande sorriso quando o motor solta um ronco e se estabiliza em um rosnado constante. O veículo é um Coupe branco de 1968, para ser mais preciso, um conversível com faróis retráteis e o interior de couro preto; e você não precisa zoá-lo por isso, porque ele vem ouvindo muita merda desde que comprou o carro de cafetão há algumas semanas. “Todo mundo diz que é ou uma extensão para o seu pênis ou uma crise de meia idade,” ele diz, “e eu sou muito novo para uma crise de meia idade…” Ele tem 26 anos, mas, devido à vida que vem levando ultimamente – como baterista da monstruosamente famosa Nirvana e agora como guitarrista e vocalista de sua nova banda Foo Fighters – é quase surpreendente que ele não tenha atingido a massa crítica. Mas enquanto Grohl tem opiniões divididas sobre seu próprio sucesso e se sente desconfortável como celebridade, isso parece não tê-lo impedido de ajudar a criar o exuberante e grudento hino punk da década.
Além das grandes expectativas rondando o Foo Fighters – que inclui o guitarrista Pat Smear (ex-The Germs e guitarrista de tour do Nirvana), o baixista Nate Mendel e o baterista William Goldsmith (ambos da finada Sunny Day Real Estate) – Grohl está determinado a dominar os holofotes da mídia, impondo um apagão quase total. É uma decisão tomada quase totalmente baseada em sua experiência como parte da banda de rock mais sensacionalista e analisada da recente história. “A coisa toda meio que me apavora,” ele reconhece, “tenho certeza que a principal razão das pessoas quererem fazer entrevistas conosco é para conhecer melhor o membro daquela banda que se autodestruiu e encontrar uma explicação.”. Mesmo assim, a decisão do Foo Fighters de querer combater a mídia não parece ter impedido os fazedores de mitos da imprensa – como exemplo a manchete do Toronto Star: “O Foo Fighters prova que há vida após a morte”.
Sem o benefício da promoção de pré-lançamento ou propaganda, o primeiro álbum do Foo Fighters se tornou assunto antes mesmo de ser lançado, com vários bootlegs circulando pela cena musical de Seattle. “Eu dei fitas pra todo mundo,” admite Grohl, “crianças vinham até mim e diziam ‘Nirvana era minha banda favorita’, então eu falava ‘Bom… pegue isto então.’”. Quase dois meses antes do lançamento oficial do álbum, estações de rádio de Los Angeles e Seattle começaram a tocar versões incompletas das músicas. A Capitol Records emitiu instantaneamente uma ordem de lançamento, mas não antes das linhas de telefones se encherem com inúmeros pedidos. Em última análise, Grohl é forçado a conceder. “Não há muito que fazer. Se você não quer que as pessoas venham ao seu show, então não grave um disco ou monte uma banda. Fique no porão.”
Mesmo uma turnê enorme com uma das maiores bandas da história do rock não preparou Grohl para tomar a frente de seu próprio grupo. “Sentar-se lá atrás tocando bateria, você pode simplesmente se esconder, e o som é tão alto que nem parece que é você tocando,” ele diz, oferecendo indiretamente uma possível motivação para a selvageria que alimentava o Nirvana. Sobre a primeira turnê dos Foos, na qual eles viajaram pelos Estados Unidos abrindo os shows de Mike Watt, Grohl diz, “Foi incrivelmente refrescante sair e fazer algo de que você tem medo, muito medo de fazer. De vez em quando, no meio do set, meu estômago virava e eu tinha um ataque de pânico.”.
Grohl está convencido de que o Foo Fighters é obra do esforço de uma equipe. “Meu maior medo é que isso seja visto como um projeto solo,” ele diz. “É ridículo porque eu não tenho o carisma do Bono ou do Steven Tyler ou quem quer que seja, e de jeito nenhum eu quero ser conhecido como um deles. Isso é meu maior pesadelo.”. E para alimentar este pesadelo e o foco da mídia em Grohl, se dá o fato de que o álbum, gravado antes da banda se formar, é obra virtuosa da banda de um homem só – Grohl canta e toca todos os instrumentos. Ele e o co-produtor Barrett Jones gravaram o álbum inteiro em 5 dias, em Outubro. Embora a maioria dos críticos tenha ficado surpresa pela antes desconhecida habilidade de Grohl em compor músicas, o álbum do Foo Fighters é só mais um da série de gravações que Dave tem feito desde o tempo da escola. Inicialmente, era só pra ser um escape criativo, uma chance “para ser capaz de fazer suas próprias músicas sem que isso seja grande coisa,” ele diz. “Eu nunca levei isso tão a sério do tipo ‘uau, eu vou começar uma banda de rock, ser o cara que canta, colocar algumas piadas no meio das músicas e sorrir para as câmeras.’”. Mas não demorou muito para os chefões da industria musical se apoderarem da demo. “Do nada eu tinha tipo umas quatro gravadoras me ligando,” diz Grohl. “Foi maluco.” No final, ele assinou um acordo de distribuição com a Capitol que deu a sua própria gravadora, a Roswell Records, controle total sobre o material e maior parte dos lucros.
Depois de recrutar Smear, Grohl se apresentou a Goldsmith e Mendel assim que o Sunny Day Real Estate anunciou seu fim. Goldsmith, que chama Grohl de “um dos meus bateristas preferidos de todos os tempos,” diz que a coisa toda teve um começo meio complicado. “Eu realmente não me sentia confortável em tocar bateria para o Dave, eu me sentia muito esquisito e inadequado e tal. Eu sentei com ele e falei, ‘isso é tudo para mim, mas não sei se tenho o necessário’, então ele disse, ‘bom, se você desistir, eu desisto’. Ele foi muito solidário.”. Depois de alguns shows locais, a banda se juntou a Mike Watts para uma turnê pelos EUA e, seguido de uma pequena pausa quando Goldsmith deslocou seu cotovelo batendo em um poste de concreto de um estacionamento, eles caíram na estrada novamente – agora como headliners. Determinados em manter as coisas tranquilas, o Foo Fighters tocava apenas em casas de show de porte médio. Discutindo sobre um dos exemplos da preparação da turnê, Grohl parece surpreso com as regalias que algumas bandas pedem. “É ridículo pra caralho. Pat gosta de Perrier e eu só gosto de Coca Cola e Budweiser em lata. Eu sou bem simples pra essas coisas. Sou completamente tedioso.”. Grohl faz apenas uma exceção a toda essa loucura de rockstar: ele é uma espécie de fã de ÓVNIS. “Eu realmente acredito que há algo sendo escondido de nós,” ele diz atentamente. “Quero dizer, certamente tem algo acontecendo, seja os militares testando suas próprias porcarias ou qualquer outra coisa…”. Sentado em uma mesa estreita em sua casa estilo rancho em Seattle, ele encara a floresta sinistra repleta de pinheiros altos e acende um cigarro. “Eu costumava sentar na minha varanda e ficar olhando para o céu, rezando para ver uma porra de um OVNI,” ele diz. “Mas quem sabe? A ideia de que há algo mais do que as cinco bilhões de pessoas neste planeta é uma espécie de entretenimento.”.
“Tenho certeza que o álbum será fervorosamente analisado e comparado com o Nirvana,” Grohl suspira com resignação, “e, claro, há algumas semelhanças. Eu aprendi muito sobre compor canções com o Kurt.”. A influência é aparente naquela química grunge de ganchos irresistíveis e guitarras ferozes no maior estilo punk, caracterizada em “I’ll Stick Around”. Mas enquanto o Nirvana trabalhava com uma fórmula, a composição de Grohl é complexa e em tons variados, indo da arrastada “Exhausted” até a engraçada balada lounge rock, “For All The Cows”. E o vocal confiante de Grohl nada se compara ao desprezo na voz de Cobain. Mesmo em um gemido de frustração como “Alone + Easy Target”, Grohl coloca uma colher de açúcar na mistura, cantando com sinceridade sobre as pesadas guitarras.
Se os Foo Fighters conseguem colocar um sorriso espertinho na face da década punk rock de 90 e adoçar o grunge, isso se deve ao fato deles realmente gostarem de tocar juntos. “Todos nós viemos de bandas acabadas,” Dave explica. Desta vez, porém, os recadinhos carinhosos parecem ter se definido. “É o tipo de sentimento que você tem quando vê uma caixa cheia de gatinhos fofos,” diz Goldsmith, e dá para sentir a conexão deles como banda quando Grohl fala sobre o status da “asa quebrada do Will” e enfatiza que é responsabilidade da banda “cuidar dele até sarar.”. Ou quando Smear começa a massagear os ombros de Dave. Ou quando William coloca seu braço bom em volta do pescoço de Mendel ou dá um grande beijo molhado na bochecha de Smear. “A principal razão de tudo é o fato de que estamos fazendo isso juntos e nos importamos uns com os outros,” diz Goldsmith.
Se há uma ponta de sarcasmo ali, é só para disfarçar o fato de que ele realmente disse isso pra valer. “Todo mundo é realmente honesto, aberto, carinhoso e solidário. É tipo o show perfeito.”.
por Aaron Gell – Blender, 1995
Tradução: Stephanie Hahne